PUBLICADO NO HOJEMACAU DIAS 11 e 18.12.2025
Lições de 2025 para a década (HOJEMACAU 11.12.2025)
Lições de 2025 para a Década (HOJEMACAU 18.12.2025 2 PARTE)
“In a
year of converging crises and recalibrated ambitions, 2025 taught the world
that resilience is not merely endurance, but the capacity to adapt, reimagine,
and act with foresight across economic, political, environmental, and
technological frontiers.”
Margaret Atwood
O ano de 2025 ficará inscrito na história
contemporânea como um período de intensas transformações, marcado por
acontecimentos que atravessaram múltiplas dimensões da vida internacional e que
exigiram dos Estados, das instituições e das sociedades uma capacidade de
adaptação sem precedentes. No plano económico, verificou-se uma desaceleração
global que reflectiu os efeitos acumulados de políticas monetárias restritivas,
tensões comerciais e instabilidade geopolítica. O crescimento mundial situou-se
em torno de valores modestos, insuficientes para responder às necessidades de
inclusão social e de redução das desigualdades. A transição do ciclo de subida
de taxas de juro para cortes graduais trouxe algum alívio às condições
financeiras, mas revelou também fragilidades estruturais, com mercados
emergentes a enfrentar restrições fiscais e cambiais que limitaram a sua margem
de manobra. A América Latina registou uma expansão insuficiente para gerar emprego
sustentável, enquanto a África continuou a lutar pela diversificação das suas
economias, excessivamente dependentes de commodities. A Ásia manteve dinamismo
industrial e tecnológico, mas a China enfrentou o desafio de estimular o
consumo interno e corrigir desequilíbrios estruturais que se tornaram mais
evidentes.
No plano político, o regresso de Donald Trump à
presidência dos Estados Unidos em Janeiro constituiu um dos acontecimentos mais
marcantes do ano. A sua agenda voltou a ser dominada pelo lema “America First”,
com medidas proteccionistas, expulsões em massa de imigrantes irregulares e o
desmantelamento de sectores do governo federal. Estas acções geraram
contestação judicial e acentuaram a polarização política interna, com a
utilização da Guarda Nacional em cidades governadas por democratas e ataques
aos meios de comunicação a reforçarem a percepção de erosão institucional. No
plano internacional, Trump intensificou a actividade diplomática, com
resultados variáveis, mas conseguiu protagonizar um papel central na trégua
precária alcançada em Gaza, após dois anos de guerra entre Israel e o Hamas.
Este cessar-fogo permitiu a libertação de reféns e prisioneiros, bem como o
aumento da ajuda humanitária, embora insuficiente segundo a ONU, e deixou em aberto
a questão delicada do desarmamento do Hamas.
A instabilidade no Médio Oriente foi agravada por
ataques israelitas a instalações nucleares iranianas, que desencadearam uma
guerra de doze dias entre os dois países, com bombardeamentos americanos no Irão.
Em Setembro, Israel realizou operações inéditas contra altos dirigentes do
Hamas em Doha, no Catar, ampliando a tensão regional. Paralelamente, os Estados
Unidos intensificaram acções militares nas Caraíbas e no Pacífico, justificadas
como combate ao narcotráfico, mas criticadas pela ONU como execuções
extrajudiciais. Estas operações, que resultaram em dezenas de mortos,
evidenciaram a disposição americana em projectar poder militar para além do
Médio Oriente, reforçando a percepção de unilateralismo e contestação
internacional.
No plano geopolítico, a invasão da Ucrânia pela
Rússia continuou a ter repercussões, com sanções e tensões energéticas a
afectar a Europa. O conflito prolongado manteve a instabilidade na região e
reforçou a necessidade de diversificação energética, acelerando a transição
para fontes renováveis. No Sudão e em outras regiões africanas, guerras
internas agravaram crises humanitárias, com milhões de deslocados e sistemas
estatais em colapso. A cooperação internacional revelou fragilidades, com
dificuldades em revitalizar mecanismos multilaterais e em garantir
previsibilidade nos fluxos comerciais.
No plano ambiental, os impactos das mudanças
climáticas tornaram-se cada vez mais evidentes. Ondas de calor devastaram a
Ásia, inundações atingiram o Brasil, a Indonésia e partes da Europa, incêndios
florestais devastaram o Canadá e furacões como o Helene e Milton provocaram
destruição nos Estados Unidos. Estes fenómenos expuseram a urgência da
transição energética e da redução da dependência de combustíveis fósseis. A
descarbonização da economia foi reconhecida não apenas como exigência
ambiental, mas como oportunidade económica, com investimentos em energias
limpas, mobilidade sustentável e eficiência energética a gerar empregos e a
posicionar países como líderes na nova economia verde. O Fórum Económico
Mundial identificou como principais riscos para 2025 os conflitos armados, os
eventos climáticos extremos e os confrontos geoeconómicos. A conjugação destes
factores revelou a necessidade de acção coordenada e estratégica. A regulação
das tecnologias emergentes tornou-se tema central, com debates sobre protecção
de dados, inovação responsável e riscos sistémicos. A ausência de normas
globais claras aumentou as assimetrias e a insegurança digital, sobretudo em
áreas como criptomoedas, inteligência artificial e plataformas digitais.
As comparações regionais revelam disparidades
significativas. Nos Estados Unidos, o crescimento rondou os 2,1%, reflectindo cortes graduais nas taxas
de juro e políticas proteccionistas. A inflação desceu para valores próximos de
3%,
mas o consumo interno manteve-se frágil. Na União Europeia, o crescimento médio
foi de 1,3%,
com a Alemanha a investir cerca de 40 mil milhões de euros em programas
de transição energética e a França a reforçar a aposta na energia nuclear.
Portugal registou um crescimento de 2,1%, sustentado pelo turismo, que recuperou para níveis recorde, com
mais de 30
milhões de visitantes e receitas superiores a 62 mil milhões de euros,
representando cerca de 21,5% do PIB, embora tenha enfrentado inflação
persistente nos bens alimentares. Na América Latina, o Brasil cresceu 2,4%, mas enfrentou inundações severas que
afectaram mais de 3 milhões de pessoas e provocaram perdas económicas
estimadas em 15
mil milhões de dólares, apesar de a inflação se ter mantido em
torno de 5%.
A Argentina registou um crescimento de 5,5%, com inflação próxima de 30%, muito abaixo dos níveis
superiores a 100% dos anos anteriores, reflectindo políticas de estabilização
fiscal e monetária.
Em África, o crescimento médio foi de 3,5%, mas desigual, com a Nigéria e Angola
vulneráveis à volatilidade dos preços do petróleo e países do Sahel a viverem
crises humanitárias agravadas por desertificação e conflitos armados. Na Ásia,
a China cresceu cerca de 5%, abaixo das metas oficiais, reflectindo a necessidade
de estimular o consumo interno. A Índia registou um crescimento robusto entre 7,5% e 8%, impulsionado por investimentos em
digitalização, energias renováveis e reformas fiscais, mantendo-se como a
economia de maior expansão global. Assim, o panorama económico de 2025 confirma
fortes
disparidades regionais. As economias dos Estados Unidos e União
Europeia cresceram modestamente, enquanto a Índia e a China lideraram a expansão global.
A Argentina
destacou-se pela estabilização após anos de hiperinflação, e o Brasil enfrentou choques
climáticos severos. A África manteve o crescimento médio
positivo, mas marcado por desigualdades estruturais e crises humanitárias.
Os impactos sociais foram profundos. Nos Estados
Unidos, as políticas de expulsão de imigrantes afectaram centenas de milhares
de famílias. Na Europa, o aumento do custo da energia provocou manifestações em
países como França e Itália. No Brasil, as inundações destruíram comunidades
inteiras, obrigando à realocação de mais de 500 mil pessoas. Em África, a
escassez de água intensificou migrações internas. A crise de consumo interno em
Macau reflectiu a diminuição do poder de compra dos turistas chineses e a
retracção da procura local, afectando directamente sectores como a restauração
e o comércio.
As políticas ambientais ganharam destaque. A União
Europeia reforçou o Pacto Ecológico Europeu, investindo mais de 100 mil milhões
de euros em energias renováveis e mobilidade sustentável. O Canadá lançou
programas de reflorestação que abrangeram 1 milhão de hectares. O Brasil
procurou implementar políticas de gestão de inundações com investimentos de 10
mil milhões de dólares. A China investiu em tecnologias de armazenamento de
energia, com projectos avaliados em 50 mil milhões de dólares. A Índia ampliou
programas solares em zonas rurais, garantindo electricidade a milhões de
pessoas.
No campo tecnológico, a inteligência artificial e
a digitalização transformaram economias e sociedades. Entre 2026 e 2030, mais
de 50% das tarefas administrativas poderão ser automatizadas, criando novos
desafios de emprego e exigindo políticas de requalificação. A utilização de
criptomoedas e de tecnologias financeiras digitais poderá atingir mais de 500
milhões de utilizadores activos. A regulação global da inteligência artificial
e das plataformas digitais será fundamental para evitar abusos de mercado e
riscos sistémicos. Países como o Japão e a Coreia do Sul avançarão com
legislações rigorosas, enquanto a Europa procurará liderar a criação de normas
globais.
No sector da educação, a digitalização e a
inclusão serão prioridades. Até 2030, mais de 70% das escolas em países
desenvolvidos poderão utilizar plataformas digitais para ensino híbrido. A
inteligência artificial será utilizada para personalizar aprendizagem,
adaptando conteúdos às necessidades individuais dos estudantes. Contudo,
desigualdades persistirão em África e em partes da América Latina. A educação
técnica e a formação contínua serão essenciais para preparar trabalhadores para
novas exigências do mercado.
No sector da segurança, o mundo enfrentará
desafios complexos. O terrorismo poderá assumir novas formas, com utilização de
tecnologias digitais e de inteligência artificial. A cibersegurança tornar-se-á
prioridade, com ataques digitais a sistemas críticos a representar riscos
significativos. Estima-se que até 2030 os custos globais de ciberataques possam
ultrapassar 10 mil milhões de dólares anuais. No plano militar, tensões
geopolíticas entre os Estados Unidos e a China poderão intensificar-se. O Médio
Oriente continuará a ser foco de instabilidade. Entre 2026 e 2030, os cenários
sociais e culturais assumirão papel determinante na configuração do futuro
global. A migração internacional continuará a ser um dos fenómenos mais
marcantes, impulsionada por conflitos armados, desigualdades económicas e
alterações climáticas.
Estima-se que centenas de milhões de pessoas
possam estar em situação de mobilidade internacional ou interna, seja por
procura de melhores condições de vida, seja por necessidade de sobrevivência. A
Europa enfrentará pressões migratórias vindas de África e do Médio Oriente, com
centenas de milhares de pessoas a procurar refúgio em países como Itália,
Grécia, Espanha e Alemanha. Este fluxo exigirá políticas de integração mais
robustas, mas também poderá gerar tensões sociais e políticas, alimentando
discursos populistas e nacionalistas.
Nos Estados Unidos, a imigração continuará a ser
tema central, com políticas restritivas a provocar tensões sociais e protestos,
mas também com a necessidade de mão-de-obra em sectores como agricultura,
construção e serviços. Na América Latina, migrações internas intensificar-se-ão
devido a fenómenos climáticos extremos, como inundações e secas, obrigando
milhões de pessoas a deslocar-se das zonas rurais para as cidades. Em África, a
desertificação e os conflitos armados no Sahel poderão deslocar mais de 20
milhões de pessoas, criando crises humanitárias de grande escala.
A urbanização será outro fenómeno central. Até
2030, mais de 65% da população mundial viverá em áreas urbanas, com megacidades
a crescerem de forma acelerada. Cidades como Lagos, Kinshasa, Mumbai, São Paulo
e Jacarta poderão ultrapassar os 30 milhões de habitantes, enfrentando desafios
de infra-estrutura, habitação, transporte e saneamento. A urbanização acelerada
trará oportunidades de dinamismo económico e cultural, mas também riscos de
desigualdade e exclusão social. As cidades terão de investir em soluções
sustentáveis, como transportes públicos eficientes, habitação acessível e
gestão de resíduos. A digitalização das cidades, com recurso a tecnologias
inteligentes, poderá melhorar a qualidade de vida, mas exigirá políticas de
inclusão para evitar que populações vulneráveis fiquem excluídas.
As transformações demográficas serão igualmente
decisivas. O envelhecimento populacional na Europa, Japão e Coreia do Sul
exigirá políticas de saúde e de cuidados de longa duração, com impacto nos
sistemas de pensões e na sustentabilidade fiscal. Estima-se que, até 2030, mais
de 25% da população da Europa tenha mais de 65 anos, criando desafios de
produtividade e de financiamento dos sistemas sociais. Em contrapartida, África
e partes da Ásia terão populações jovens em crescimento, com milhões de pessoas
a entrar no mercado de trabalho. Este fenómeno poderá ser uma oportunidade de
dinamismo económico, mas também um risco de instabilidade se não forem criados
empregos suficientes. A Índia, por exemplo, terá mais de 1,5 mil milhões de
habitantes em 2030, com uma população jovem que poderá impulsionar crescimento,
mas que exigirá investimentos massivos em educação e formação. A China
enfrentará o desafio de uma população envelhecida, com mais de 400 milhões de
pessoas acima dos 60 anos em 2030, o que poderá limitar o dinamismo económico e
aumentar pressões sobre sistemas de saúde e pensões.
Os cenários culturais também se transformarão. A
globalização digital continuará a difundir valores e práticas culturais, mas
também a gerar tensões entre tradições locais e influências externas. A música,
o cinema e a literatura circularão de forma cada vez mais intensa, criando uma
cultura global híbrida. Contudo, movimentos de afirmação identitária e de valorização
de culturas locais ganharão força, procurando preservar tradições e resistir à
homogeneização cultural. A diversidade cultural será simultaneamente uma
riqueza e um desafio, exigindo políticas de inclusão e de respeito pela
diferença.
As migrações, a urbanização e as transformações
demográficas interagirão com fenómenos ambientais e tecnológicos. As cidades
terão de se adaptar a fenómenos climáticos extremos, como inundações e ondas de
calor, que afectarão milhões de pessoas. A migração climática tornar-se-á
realidade, com populações inteiras a deslocar-se devido à subida do nível do
mar e à desertificação. A urbanização acelerada exigirá soluções tecnológicas,
como cidades inteligentes e infra-estruturas sustentáveis, mas também políticas
sociais para garantir inclusão. As transformações demográficas criarão novos
equilíbrios de poder, com África e Ásia a ganhar peso demográfico e económico,
enquanto a Europa e Japão enfrentarão desafios de envelhecimento.
Em síntese, o período entre 2025 e 2030 pode ser
descrito como uma fase de transição crítica, em que os acontecimentos de 2025
funcionaram como catalisadores de mudanças estruturais que se manifestaram em
diferentes dimensões. A economia global entrou num ciclo de recuperação
moderada, mas com riscos persistentes. A política internacional foi marcada por
polarização e por tensões geopolíticas, com os Estados Unidos e a China a
disputar a liderança tecnológica e industrial, e o Médio Oriente a permanecer
como foco de instabilidade. O ambiente revelou a urgência da transição
energética e da adaptação climática, com fenómenos extremos a afectarem milhões
de pessoas. A tecnologia transformou economias e sociedades, criando
oportunidades e riscos. A educação e a saúde exigiram políticas inclusivas e inovadoras.
A segurança tornou-se prioridade, com ciberataques e terrorismo digital a
representar riscos significativos. Os cenários sociais e culturais revelaram a
importância da migração, da urbanização e das transformações demográficas.
O futuro dependerá da capacidade de articular
interesses nacionais com responsabilidades colectivas, construindo um
equilíbrio entre competitividade e solidariedade. Se os países conseguirem
investir em inovação responsável, em educação inclusiva e em sustentabilidade
energética, será possível construir um futuro mais justo, sustentável e
inclusivo. Caso contrário, o risco de estagnação prolongada e de agravamento
das desigualdades permanecerá elevado. O período entre 2025 e 2030 ficará,
assim, como um momento decisivo, em que a humanidade foi chamada a escolher
entre a cooperação e a fragmentação, entre a coragem de avançar e o risco de
permanecer prisioneira das suas próprias contradições.
Jorge Rodrigues Simão

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